
Direitos dos Consumidores: Contratos à Distância e Celebrados Fora do Estabelecimento
O Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14 de fevereiro, transpõe a Diretiva n.º 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro, que define as regras aplicáveis aos contratos celebrados à distância e aos contratos celebrados fora do estabelecimento, e pretende assegurar a transparência das práticas comerciais e salvaguardar os interesses legítimos dos consumidores.
CONTRATO CELEBRADO À DISTÂNCIA
Um contrato celebrado à distância é um contrato celebrado entre um consumidor e um fornecedor de bens ou prestador de serviços sem presença física de ambos e que está integrado num sistema de venda ou prestação de serviços organizado para o comércio à distância. Concretiza-se mediante a utilização exclusiva de uma ou mais técnicas de comunicação à distância até à celebração do contrato, incluindo a própria celebração.
CONTRATO CELEBRADO FORA DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL
O contrato celebrado fora do estabelecimento comercial é um contrato celebrado na presença física simultânea do fornecedor de bens ou do prestador de serviços e do consumidor, num local que não seja o estabelecimento comercial do primeiro.
INFORMAÇÃO PRÉ-CONTRATUAL
A informação pré-contratual refere-se a toda a informação que deve ser transmitida ao consumidor, em tempo útil, de forma clara e compreensível, antes de se vincular.
Algumas Informações a Prestar ao Consumidor:
- Identidade do fornecedor de bens ou do prestador de serviços;
- Endereço físico do estabelecimento comercial do profissional;
- Características essenciais do bem ou serviço;
- Preço total do bem ou serviço, incluindo taxas e impostos, encargos suplementares de transporte, despesas postais ou de entrega ou quaisquer outros encargos;
- Modalidades de pagamento, de entrega, de execução, a data-limite em que o profissional se compromete a entregar o bem ou a prestar o serviço, e, se for o caso, o sistema de tratamento de reclamações dos consumidores pelo fornecedor de bens ou prestador de serviços;
- A existência do direito de livre resolução* do contrato, o respetivo prazo e o procedimento para o exercício do direito;
- A existência e o prazo da garantia de conformidade dos bens, dos conteúdos ou serviços digitais, quando aplicável;
- A existência e condições de assistência pós-venda, de serviços pós-venda e de garantias comerciais quando for o caso;
- A duração mínima das obrigações dos consumidores decorrentes do contrato, quando for o caso.
INFORMAÇÃO PRÉ-CONTRATUAL ESPECÍFICA
MERCADO EM LINHA (por exemplo, Marketplace) – Serviço com recurso a software, nomeadamente um sítio eletrónico, parte de um sítio eletrónico ou uma aplicação, explorado pelo profissional ou em seu nome, que permita aos consumidores celebrar contratos à distância com outros profissionais ou consumidores.
No âmbitos destes contratos, é necessário fazer chegar ao consumidor algumas informações pré-contratuais específicas, nomeadamente:
- Informação inequívoca de que as propostas apresentadas, nomeadamente a disponibilidade e características do bem ou serviço, se referem exclusivamente às do prestador do mercado em linha;
- Informação sobre se o terceiro que oferece os bens, serviços ou conteúdos digitais é ou não um profissional, com base nas declarações prestadas por aquele ao prestador do mercado em linha;
- No caso de o terceiro que oferece os bens, serviços ou conteúdos digitais não ser um profissional, a informação de que os direitos do consumidor decorrentes do direito da União em matéria de defesa dos consumidores não se aplicam ao contrato celebrado;
- O modo como as obrigações contratuais são partilhadas entre o terceiro que oferece os bens, serviços ou conteúdos digitais e o prestador do mercado em linha.
REQUISITOS DE FORMA
Contratos à Distância:
- Quando a encomenda pelo consumidor implicar uma obrigação de pagamento, além dos deveres de informação, o fornecedor de bens ou prestador de serviços deve garantir que o consumidor, ao concluir a encomenda confirma, de forma expressa e consciente, que a encomenda implica a obrigação de pagamento;
- Quando a conclusão da encomenda implicar a ativação de um botão ou função semelhante, o botão ou a referida função é identificada de forma facilmente legível, apenas com a expressão «encomenda com obrigação de pagar» ou uma formulação correspondente e inequívoca, que indique que a realização da encomenda implica uma obrigação de pagamento ao profissional;
- Em caso de comunicação por via telefónica, a identidade do fornecedor do bem ou prestador de serviços ou do profissional que atue em seu nome ou por sua conta e o objetivo comercial da chamada devem ser explicitamente comunicados no início de qualquer contacto com o consumidor;
- Quando o contrato for celebrado por telefone, o consumidor só fica vinculado depois de assinar a oferta ou enviar o seu consentimento escrito ao fornecedor de bens ou prestador de serviços, exceto nos casos em que o primeiro contacto telefónico seja efetuado pelo próprio consumidor;
- Se o fornecedor de bens ou prestador de serviços não cumprir os seus deveres de informação o consumidor pode não ficar vinculado ao contrato;
- O fornecedor de bens ou prestador de serviços deve confirmar a celebração do contrato à distância, em suporte duradouro, no prazo de cinco dias contados dessa celebração e, o mais tardar, no momento da entrega do bem ou antes do início da prestação do serviço;
- A confirmação do contrato realiza-se com a entrega ao consumidor das informações pré-contratuais, salvo se o profissional já tiver prestado essa informação, em suporte duradouro, antes da celebração do contrato.
Contratos Celebrados Fora do Estabelecimento Comercial:
- Reduzido a escrito;
- Com informações prestada de forma clara e compreensível e na língua portuguesa;
- O fornecedor de bens ou prestador de serviços deve entregar ao consumidor uma cópia do contrato assinado ou a confirmação do contrato em papel ou, se o consumidor concordar, noutro suporte duradouro.
RESTRIÇÕES
- Nos sítios na Internet dedicados ao comércio eletrónico é obrigatória a indicação, de forma clara e legível, o mais tardar no início do processo de encomenda, da eventual existência de restrições geográficas ou outras à entrega e aos meios de pagamento aceites;
- O envio de comunicações não solicitadas através da utilização de técnicas de comunicação à distância depende do consentimento prévio expresso do consumidor.
DIREITO DE LIVRE RESOLUÇÃO
O consumidor tem o direito de resolver o contrato sem incorrer em quaisquer custos, com exceção de custos adicionais de entrega e custos de devolução do bem, quando for caso disso, e sem necessidade de indicar o motivo, no prazo de 14 dias ou, nalguns casos dos contratos celebrados fora do estabelecimento comercial no prazo de 30 dias, sendo que as partes podem fixar prazo mais alargado, mas não inferior, para o exercício do direito de livre resolução.
Se o fornecedor de bens ou prestador de serviços não cumprir o dever de informação pré-contratual relativo à existência do direito de livre resolução do contrato, o prazo para o exercício do direito de livre resolução pode ser de 12 meses (após aqueles 14 dias).
Exercício
O consumidor pode exercer o seu direito de livre resolução através do envio de um modelo preexistente ou através de qualquer outra declaração inequívoca de resolução do contrato, ou seja, declaração em que o consumidor comunica, por palavras suas, a decisão de resolver o contrato designadamente por carta, por contacto telefónico, pela devolução do bem ou por outro meio suscetível de prova, nos termos gerais.
Obrigações do Fornecedor ou Prestador
- No prazo de 14 dias a contar da data em que for informado da decisão de resolução do contrato, o fornecedor de bens ou prestador de serviços deve reembolsar o consumidor;
- O fornecedor pode reter o reembolso enquanto os bens não forem por este recebidos ou enquanto o consumidor não apresentar prova da sua devolução;
- O reembolso dos pagamentos deve ser feito através do mesmo meio de pagamento que tiver sido utilizado pelo consumidor na transação inicial, salvo acordo expresso em contrário e desde que o consumidor não incorra em quaisquer custos como consequência do reembolso;
- O fornecedor do bem não é obrigado a reembolsar os custos adicionais de entrega quando o consumidor solicitar, expressamente, uma modalidade de entrega diferente e mais onerosa do que a modalidade comummente aceite e menos onerosa proposta pelo fornecedor do bem;
- Quando o bem entregue no domicílio do consumidor no momento da celebração de um contrato celebrado fora do estabelecimento comercial, não puder, pela sua natureza ou dimensão, ser devolvido por correio, incumbe ao fornecedor recolher o bem e suportar o respetivo custo;
- O incumprimento da obrigação de reembolso dentro do prazo previsto, obriga o fornecedor de bens ou prestador de serviços a devolver em dobro, no prazo de 15 dias úteis, os montantes pagos pelo consumidor, sem prejuízo do direito do consumidor a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.
Obrigações do Consumidor
- Caso o fornecedor de bens não se ofereça para recolher ele próprio o bem, o consumidor deve no prazo de 14 dias a contar da data em que tiver comunicado a sua decisão de resolução do contrato devolver ou entregar o bem ao fornecedor de bens ou a uma pessoa autorizada para o efeito;
- Por regra, incumbe ao consumidor suportar o custo da devolução do bem, salvos alguns casos, nomeadamente se não tiver sido informado previamente do dever de suportar esse custo;
- O consumidor deve conservar os bens de modo a poder restituí-los nas devidas condições de utilização.
Inspeção e Manipulação do Bem
- O exercício do direito de livre resolução não prejudica o direito de o consumidor inspecionar, com o devido cuidado, a natureza, as características e o funcionamento do bem;
- O consumidor pode ser responsabilizado pela depreciação do bem, se a manipulação efetuada para inspecionar a natureza, as características e o funcionamento desse bem exceder a manipulação que habitualmente é admitida em estabelecimento comercial;
- Em caso algum, o consumidor é responsabilizado pela depreciação do bem quando o fornecedor não o tiver informado do seu direito de livre resolução.
Efeitos
- O exercício do direito de livre resolução implica a resolução automática dos contratos acessórios ao contrato celebrado à distância ou do contrato celebrado fora do estabelecimento comercial sem direito a indemnização ou pagamento de quaisquer encargos, com exceção de custos adicionais de entrega e custos de devolução do bem;
- O contrato de crédito associado será igualmente resolvido.
Exceções
Salvo acordo das partes em contrário, o consumidor não pode resolver livremente determinados contratos, nomeadamente:
-
- Prestação de serviços em que os serviços tenham sido integralmente prestados;
- Fornecimento de bens personalizados;
- Fornecimento de bens que, por natureza, não possam ser reenviados ou sejam suscetíveis de se deteriorarem ou de ficarem rapidamente fora de prazo;
- Fornecimento de bens selados não suscetíveis de devolução, por motivos de proteção da saúde ou de higiene quando abertos após a entrega;
- Fornecimento de gravações áudio ou vídeo seladas ou de programas informáticos selados, a que o consumidor tenha retirado o selo de garantia de inviolabilidade após a entrega.
EXECUÇÃO DO CONTRATO CELEBRADO À DISTÂNCIA
Salvo acordo em contrário entre as partes, o fornecedor de bens ou prestador de serviços deve dar cumprimento à encomenda no prazo máximo de 30 dias, a contar do dia seguinte à celebração do contrato.
Em caso de incumprimento do contrato devido a indisponibilidade do bem ou serviço encomendado, o fornecedor de bens ou prestador de serviços deve informar o consumidor desse facto e reembolsá-lo dos montantes pagos, no prazo máximo de 30 dias a contar da data do conhecimento daquela indisponibilidade.
Decorrido o prazo de reembolso sem que o consumidor tenha sido reembolsado dos montantes pagos, o fornecedor fica obrigado a devolver em dobro, no prazo de 15 dias úteis, os montantes pagos pelo consumidor.
Contudo, o fornecedor pode fornecer um bem ou prestar um serviço ao consumidor de qualidade e preço equivalentes, desde que essa possibilidade tenha sido prevista antes da celebração do contrato ou no contrato e o consumidor o tenha consentido expressamente.
INFORMAÇÃO
De acordo com o Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14 de fevereiro, as entidades responsáveis pela sua aplicação têm a obrigação de informar os consumidores sobre os direitos que lhes são conferidos por esse diploma legal.
Essas entidades devem promover boas práticas e ações destinadas a informar os consumidores sobre os seus direitos, bem como devem promover o recurso aos mecanismos de resolução extrajudicial de conflitos entre profissionais e consumidores.
A Autoridade da Concorrência (AdC) e a ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica) têm um papel ativo na fiscalização do cumprimento das disposições legais.